domingo, 22 de agosto de 2010

"Há palavras na fala que vêm como cabelos na sopa"...


Para esquentar a conversa sobre o filme "Les mots pour le dire" e o livro "Palavras para dizer" de Marie Cardinal, no TEAR 4, dia 3/05/2010,às 13,30h, à Rua Fernandes Tourinho, 470, salão do 3o andar, publicamos algumas palavras para dizê-lo,da própria autora, quando comentava outro de seus muitos livros: "Autrement dit"
« Nos meus livros, penso que os leitores encontram uma mulher que vive na França hoje e que se parece no fundo com todas as mulheres. É o que eu sou. Conheço a magia do hermetismo.Eu o encontrei durante minha psicanálise e compreendo que se escolha esta via,a do hermetismo, mas eu não a escolhi, eu escolhi outra, a via da massa, aquela das pessoas. Posso lhe dizer porque fiz esta escolha, mas quero primeiro falar de um discurso secreto, talvez muito poético, totalmente satisfatório, que se pode estabelecer entre um analista e seu analisante. Há, frequentemente, pessoas que me dizem : « Mas, já que se trata de falar totalmente sozinho, não compreendo porque é preciso um médico, deve-se poder sair-se disso sem ele ».Era o que eu mesma pensava antes.Achava que sabia tudo de introspecção.A princípio, as palavras saiam como de costume. Foram precisos alguns meses de sessões para dar-me conta que eu falava como um papagaio, que eu era mais vivida que vivente, que as palavras que eu pronunciava não me pertenciam, que elas pertenciam a minha família, ao meu meio, à minha educação. A presença muda e invisível do doutor é que me fez tomar consciência disso. Porque ele estava lá, e só se manifestava por raspadas de garganta ou mudanças de posição em sua poltrona : isso bastava. Ele nunca me julgava, nunca fazia comentários, não procurava dirigir, mas sentia-o muito atento. De repente presta-se atenção àquilo que se diz e descobre-se que há palavras na fala que vêm como cabelos na sopa e outras que não passam. Dito de outra forma, a fala se torna viva, é o começo. Depois a gente ‘pega’o costume de associar, de estabelecer relaçoes entre os momentos, as lembranças, os pensamentos, que jamais se teria antes relacionado.São as palavras que servem de veículo, que conduzem até palavras-irmãs, palavras-idênticas, palavras-sinônimas, palavras-espelho, palavras-inimigas. Estas palavras se tornam palavras chave e à medida que a análise se desenvolve, permitem uma comunicação rápida e profunda entre analista e analisado.........Pois as palavras chave são de sínteses de longas e importantes passagens da análise que englobam, elas mesmas, pedaços capitais da propria vida daquele que fala... »(Marie Cardinal,comentário em Littérature, site da internet, tradução de Angela Porto)

Nenhum comentário:

Postar um comentário