quarta-feira, 2 de março de 2011

‘NOVOS SINTOMAS’ ≈ ‘ATO MÉDICO’ : uma Fuga para as Massas


O fazer psicanalítico tem por exigência a implicação do sujeito em seus atos, e aí seu ato é o da palavra, está no campo da linguagem.
O Ato, que faz um psicanalista, no mesmo golpe, endereça o seu trabalho para a psicanálise.
O ‘seu trabalho’ quer dizer, uma insistente elaboração, na mesma medida da exigência pulsional, que força o sujeito a voltar sempre ao mesmo lugar em suas histórias, sempre ao mesmo ponto em seus entraves psíquicos, ao ato que deu origem à sua alienação significante.
Tais exigências apressam sua corrida na busca de satisfação, e não se trata aí de uma satisfação qualquer e quaisquer objetos ou bens colocados à sua disposição podem promover ganhos rápidos que enchem de brilho suas promessas.
Ora, considerando alguns fatos atuais e lendo algumas publicações recentes,  parece que esta estratégica fuga, da passagem direta do Instante de Ver ao Momento de Concluir, infiltrou-se também num certo número de teóricos da psicanálise.
 Em sua pressa de lançar respostas, na concorrência da ocupação mercantilista e lucrativa do Saber, promove-se o regime ditatorial da urgência de compreensão, em relação aos escritos e investigações clínicas das obras de Freud e de Lacan.
Será que neste contexto da pressa em se ocupar da Demanda, o que está em questão não seria da ordem da suposição freudiana e da elaboração lacaniana sobre a economia do sintoma?
Sustentemos então outras perguntas que surgem daí:
Vende-se a idéia de um Saber Sobre os Novos Sintomas... ou, pior, a visada aí seria a de uma ocultação, em massa, da verdade que jaz sob o sintoma, exatamente quando o sujeito, desta verdade, nada quer saber?
... verdade que se ordena nos enquadres complexos da castração e que nos endereça a um não-sabido que sabe...
Inventa-se esta catalogação de Novos Sintomas, a serviço de um ‘mercado do saber’ que isenta o sujeito de sua implicação no mal estar inerente a sua condição de desejante.  Esta proposição clínica não estaria colocando, arbitrariamente, a práxis da psicanálise nos mesmos moldes normativos  do ato médico?
Estes dados não seriam indicativos de um fazer sintomático, uma atuação que emerge das entranhas de um desvio na transmissão da psicanálise?

Enfim, poderíamos também arriscar aqui uma leitura :
‘Novos Sintomas’,  sobre os quais, em seu alvorecer, já incidem os raios da luz que faltava para elucidação e revelação da teia de resistências, que recaem pontualmente sobre uma linhagem da psicanálise que está agora, novamente, posta em questão.
De que lado está o sintoma ou quem é o sujeito do sintoma, na análise, quando  o que vigora é a resistência que visa impedir o giro dos discursos?
... evita-se, assim, o corte que faria retornar o saber ao lugar da verdade, sob a barra que sustenta uma impossibilidade no dizer...
 A resistência  aí é do analista’...
Pois bem, é neste atual e contemporâneo movimento das idas e vindas com os impasses da psicanálise na cultura e pela provocação destas novas formas de impasses advindas de uma transmissão em série, mas também nos confrontando com a possível urgência de trabalho que a própria formulação do impasse exige, é que trazemos a público um convite a outro modo do fazer psicanalítico, pela lógica que não é sem o tempo para compreender.  
Nosso propósito de estudo visa a transferência de trabalho, num recorte de experiências endereçadas para a psicanálise.
Esperamos que esta experiência faça seu retorno à cultura, como uma volta a mais pelo discurso do analista e, a cada analista desta experiência, ao modo de um saber fazer aí com seu sintoma.
                                                                                  Lucia Montes

2 comentários:

  1. A propósito, anunciar o "saber sobre novos sintomas" é se recusar à experiência da psicanálise na sua exigência fundamental de um tempo lógico da experiência,pontual, insistente e recorrente, na clínica, no estudo e na transferência de trabalho, como vc bem lembrou.

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  2. O que vemos na proposta de "Novos sintomas"é, mesmo, a resistência à psicanálise, por parte dos próprios analistas, que tentam se valer de uma escuta de outra ordem que nao aquela advinda da experiência da falta e de suas próprias análises caso elas o tenham levado ao lugar que irão, como analistas,se defrontar com ele(castração)Sintoma é sempre gozo e gozo encoberto...agora encoberto pelos próprios analistas que se dizem detentores de um Saber sobre "Novos sintomas", certamente em busca de um veio que lhes garanta a sobrevivência, dançando conforme a música que a "contemporaneidade"lhes dita.
    Sobre o sintoma...ele é gozo,na repetição, mas particularizado, ele é sempre novo. E a psicanálise cuida é do particular.
    Catalogar, universalizar, codificar, normatizar...são palavras que não cabem a uma conceituação analítica!

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