Enigma do desejo, Salvador Dali |
“Cem vezes sobre o tear, repõe teu trabalho”, nos lembra Boileau (1674), num célebre adágio que nos permite comparar o trabalho do escritor e o do tecelão. Em toda tecelagem temos dois elementos: os fios que correm, que vão fabricar o desenho e a trama. Na análise, também se trata dessa tecelagem.” (Marie –Christinne Laznik, in “Trabalhando com Lacan”, Zahar,pag 57)
Um trabalho de análise implica na tessitura de um fio associativo, que não é aleatório, pois, é do efeito à causa que se trama. A trama é o que sustenta o movimento do fio, decide seus espaços, reverte sua direção, solta seus pontos ou os enlaça em momentos de amarração e nós. Em outros é preciso esperar, e enquanto se espera, chulear, que é dar ponto de costura ligeiro na borda de um tecido, para que não desfie. Fazer borda ao trabalho já feito até ali, costurar, segurar o que consiste na trama, que é de estrutura, por onde corre o fio. Às vezes, são precisos pontos de ‘capitoné’, que têm mesmo de ser precisos, pontos de basta, de sustentação, que organizam o tecido e reabrem o movimento do fio, arremates necessários, mas provisórios, cortes.
Trabalhar com a angústia, como lembra Lacan, é trabalhar sem rede, como um acrobata. Mas é preciso fio, é preciso corda, o que dá a consistência é a corda, dar corda ao significante, ‘sabendo’ que há o vazio que trama o trabalho, "pois em se tratando de angústia, cada malha não tem sentido, senão deixando o vazio onde há angústia".
É aí que conta a ‘presença do analista’, na borda do vazio dessa trama.
A voz, a respiração, um som arrancado da palavra, no cavo da entonação, do suspiro sem melodia, nota destoante da música habitual, marcando aquilo que espreita, mas é esperado, do real.
Resto sem essência.
A voz, a respiração, um som arrancado da palavra, no cavo da entonação, do suspiro sem melodia, nota destoante da música habitual, marcando aquilo que espreita, mas é esperado, do real.
Resto sem essência.
Hora do sujeito se haver com uma “conta inevitável”.
Por isso,
“Cem vezes sobre o tear, repõe teu trabalho”
que fina leitura do trabalho de transferencia.
ResponderExcluirtá inspirando uma boa transferencia de trabalho.
um abraço.
Lúcia Montes
fica relançada, no seu escrito, a questão do que é 'o ponto inicial', o instante inaugural de uma análise, em relação ao qual está posta a dimensão do 'Ato', e que voce prospecta já nos fios de um 'saber fazer aí'... "talvez no tempo da delicadeza..."
ResponderExcluirLúcia Montes.
Chuleando...
ResponderExcluirAchei o blog bem bacana. Já o tinha visto ano passado e tive a oportunidade de ler artigos excelentes! Parabéns.
ResponderExcluirbj.
Miriam Lima
Angela, fiquei querendo muito mais da tecelagem do nao-findo, em torno do escrever, re-escrever, como na historia de remexer a terra a cada estaçao. Um escrito (como o de Freud) que nao cessa de voltar sobre o que ja foi dito e diz de novo, um pouco mais e mais sem fechar a questao, retomando... e tomando consistência ainda.
ResponderExcluirLelia Dias