Desde
nosso último encontro de leitura e conversas de estudos, tem surgido muitos
assuntos novos e casos relacionados a esta ‘hora da criança’ no mundo. Nessas
tantas e diferentes abordagens tive o privilégio de ser ouvinte de um acontecimento entre uma criança e sua
mãe. Vamos tomá-lo a princípio e
informalmente apenas como um fato de
linguagem, porque assim pode-se prescindir de qualquer variável pessoal ou
histórico-familiar.
Porque
esta é uma situação pertinente às questões publicadas na postagem anterior,
estou trazendo direto para o Blog o convite para que mais pessoas participem
deste trabalho de investigação.
Estamos
às voltas com alguns termos e conceituações que ganharam especificidades para a
psicanálise, mas ficamos aqui com a tarefa de, ao menos, tentar abrir a
conversa para um pouco mais além de nossos limites, e assim estendermos a
possibilidade também de mais contribuições para o tema.
Para
quem quiser se endereçar ao texto de referência, nesse momento, estamos continuando
a leitura do Seminário 16, de Lacan, “De um Outro ao outro”. (Ed.Zahar ), ao
qual se referem as citações deste recorte.
“Existe
um saber que diz: Há em algum lugar uma
verdade que não se sabe, e é ela que se articula no nível do inconsciente. É
aí que devemos encontrar a verdade sobre o saber.
Não
foi isso que dissemos sobre o sonho? (...) É um erro nos perguntarmos, a
propósito do sonho, o que quer dizer isso?, pois não é isso que importa. O que
nos importa é onde está a falha do que é dito?, e isso num nível em que o que
se diz é distinto do que se apresenta como querendo dizer alguma coisa. No
entanto, isso diz alguma coisa, sem saber o que diz, já que somos forçados a
ajudá-lo por meio de nossa ponderada interpretação.
Saber
que o sonho é possível, isso deve ser sabido. (...)
Em
função do tempo que me apressa lembro a analogia econômica que introduzi sobre
a verdade como trabalho. Pelo menos no discurso analítico, o trabalho da
verdade é bastante evidente, por ser penoso. (...)
Inversamente,
é à função do preço que homologuei o saber. O preço certamente não se
estabelece por acaso, não mais do que qualquer efeito de troca. Mas é certo que
o preço em si não constitui um trabalho, e é esse o ponto importante, porque
tampouco o saber o constitui, digam o que disserem.
Isso
é uma invenção dos pedagogos, o saber. (...) Não digo: Algum dia vocês aprenderam alguma coisa?, mas sim: Saber algo não é sempre algo que se produz
como um clarão? (...)
O
saber é isto: alguém lhes apresenta coisas que são significantes e, da maneira
como estas lhes são apresentadas, isso não quer dizer nada, e então vem um
momento em que vocês se libertam, e de repente aquilo quer dizer alguma coisa,
e é assim desde a origem. Isso se percebe pela maneira como a criança maneja
seu primeiro alfabeto, que não é aprendizagem nenhuma, porém um colapso que une
uma grande letra maiúscula com a forma do animal cuja inicial supostamente
corresponde à letra em questão. A criança faz ou não faz essa conjunção. Na maioria dos casos, ou seja, naqueles em que ela não é cercada por uma atenção
pedagógica demasiadamente grande, ela a faz.”
[‘O acontecimento Freud’]
E
quanto à verdade?... “Se em parte alguma do Outro é possível assegurar a
consistência do que é chamado verdade, onde está ela, a verdade, a não ser
naquilo a que corresponde a função do a ? (...)
Nesse
nível, [de um grito vazio, do sofrimento de ser
a verdade, um grito mudo], o que pode, no Outro, responder ao sujeito? Nada
senão aquilo que produz sua consistência e sua ingênua confiança em que ele é
como eu. Trata-se, em outras palavras, do que é seu verdadeiro esteio – sua
fabricação como objeto a. Não
há nada diante do sujeito senão ele, o um-a-mais entre tantos outros, e que de
modo algum pode responder ao grito da verdade, mas que é, muito precisamente, seu
equivalente – o não-gozo, a miséria, o desamparo e a solidão. Tal é a
contrapartida do a, desse mais-de-gozar que constitui a coerência do sujeito
enquanto eu.” [‘Da mais-valia ao mais-de-gozar’].
Bordas de um
desamparo anunciado
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É a Vovó (mãe da mãe)... que já morreu !...
---
Ela morreu de fome, mamãe?
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Não... .... ....
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Ela morreu de sono?!!
Algumas semanas antes a criança já havia se
posicionado diante da acolhida carinhosa do pai:
----
... dormiu bem filho?
---- Dormi.
---- Sonhou comigo?
---- Não, sonhei sozinho.
A condição de
‘seriedade’ no discurso, para a
psicanálise.
“Voltemos
a meu discurso e ao que pretendo com um discurso
válido:
Vou
compará-lo ao traçado de tesoura nessa matéria da qual falo quando evoco o real
do sujeito. A maneira como o traçado de tesoura cai na estrutura, ela se revela
pelo que é. Se passarmos o traçado de tesoura em algum lugar, as relações
mudam, tanto que o que não se via antes passa a ser visto depois. Dizendo, ao
mesmo tempo, não ser uma metáfora, que ilustrei com o traçado de tesoura na
banda de Moebius, que a transforma numa banda que já não tem nada a ver com o
que era antes. O passo seguinte a ser dado é perceber, a partir dessa
transformação, que o traçado da tesoura é, em si mesmo, toda a banda de
Moebius. ...
Digamos
que, no princípio, não vale a pena falar de outra coisa senão do real em que o
próprio discurso tem conseqüências. ... Foi o que de minha parte, chamei de
condição de seriedade, da última vez. (...)”
“
A estrutura, portanto, é real. Em geral, isso se determina pela convergência
para uma impossibilidade. É por isso que é real.
O
que eu digo postula a estrutura, porque visa a causa do próprio discurso. ...
repito-o, para os surdos, o que o discurso visa é a causa do próprio discurso.”
Lucia Montes
Obrigada Angela,por partilhar seu trabalho,partilha que não é sem consequências,pois provoca trabalho.
ResponderExcluirAbço,
Marta dalla Torre